Puberdade precoce: "Fiquei assustada com o diagnóstico porque ela ainda era meu bebê"
Mãe conta como percebeu que o desenvolvimento da filha estava adiantado e lembra sua reação ao receber o diagnóstico de puberdade precoce
O diagnóstico da puberdade precoce
nunca é simples para a família. "Lembro-me de ter um misto de
sentimentos. Fiquei muito assustada quando descobri que minha filha de
seis anos já estava desenvolvendo seios, afinal ela era meu bebê. Como
já podia ter sinais de uma mocinha?", lembra Maria*, médica e mãe de
Angélica*, que desenvolveu puberdade precoce.
No entanto, é importante lembrar que, com o
diagnóstico precoce e tratamento adequado, além do apoio da família, a
criança pode ter uma vida e desenvolvimento normais.
Para ajudar quem está enfrentando este diagnóstico, conversamos com Maria sobre como foi este período:
"Quando uma criança sente dores nos seios, você nunca imagina que é algo bom"
Maria percebeu que algo estava errado com o
desenvolvimento da filha quando foi abraçá-la e a menina se queixou de
dor no seio, um sinal clássico do desenvolvimento mamário. O problema é
que Angélica tinha apenas seis anos e meio de idade.
"Lembro-me que tive uma reação horrorosa, de
choque. Mas resolvi esperar um pouco para levá-la ao médico, pois na
época ela estava tomando corticoide para tratar uma alergia, e quis
acreditar que fosse isso", relata a mãe.
SAIBA MAIS
No entanto, como durante 20 dias a dor persistiu,
Maria decidiu levar a menina a um especialista. "Anos atrás, quando
minha filha apresentou estes sintomas, os protocolos diziam que o
crescimento dos seios aos seis anos não era considerado uma puberdade
precoce e muitos médicos não quiseram tratá-la", explica Maria.
Hoje, os protocolos mudaram e determinam que
meninas com desenvolvimento de pelos pubianos ou mamas antes dos oito
anos de idade devem ser avaliadas, assim como meninos que apresentam
aumento do volume dos testículos e desenvolvimento de pelos pubianos
antes dos nove anos.
"Quis tratá-la para que não pulasse nenhuma etapa do seu crescimento"
Maria acreditava que o tratamento seria importante
para sua filha, não só pela questão da altura na vida adulta, que é
prejudicada quando uma criança tem puberdade precoce, mas para que ela
não pulasse etapas importantes da infância. "Minha filha poderia ficar
muito diferente das crianças do grupo ao qual ela pertencia e nenhuma
mãe fica feliz com isso".
Ela, então, encontrou um médico disposto a tratar
Angélica e o uso de hormônios bloqueadores do eixo foi iniciado. O
tratamento da puberdade precoce vai depender muito da sua causa. Quando
ela é ocasionada por alterações no sistema nervoso central, como foi com
Angélica, o tratamento é feito com hormônios para bloquear o eixo
hormonal, que provoca a antecipação da puberdade. A ativação desse eixo é
responsável pela liberação de hormônios sexuais (estrógeno e
testosterona), que causam as mudanças da puberdade no organismo do
menino ou da menina.
Se a puberdade não for central, as causas podem ser
orgânicas e o tratamento pode ser cirúrgico ou radio/quimioterápico.
Nesses casos, o problema que originou a puberdade precoce, como tumores
na hipófise ou alguma modificação nas gônadas (como são chamadas as
glândulas sexuais de ambos os sexos - ovários nas meninas e os
testículos nos meninos), deve ter prioridade de tratamento. Só depois, a
terapia para bloquear a puberdade poderá ser iniciada. Quem vai
determinar o melhor tratamento para cada caso será o médico que
acompanha o paciente.
No caso da filha de Maria, o tratamento com
bloqueadores do eixo hormonal durou três anos, até ela completar nove.
Angélica só menstruou após os dez anos. Neste período, a maior
preocupação da mãe foi que a filha não perdesse sua infância, apesar das
mudanças corporais a diferenciarem dos amiguinhos. "Lembro-me,
inclusive, de ter sentido esse medo com muita força quando ela tinha
nove anos e não quis ganhar presente nenhum no Dia das Crianças. Isso me
deixou arrasada".
Por sorte, ela nunca percebeu a filha ou os
amiguinhos da menina preocupados com essa diferença na aparência de
Angélica. "Houve uma excursão da escola em que as meninas iam dividir o
quarto e fiquei preocupada das colegas repararem o desenvolvimento
antecipado da minha filha, mas ela mesma minimizou o problema e correu
tudo bem", lembra Maria.
Ela acredita que o adulto enxergue mais as mudanças
do corpo como um problema do que as crianças. No entanto, Angélica se
incomodava, sim, por ser mais alta do que as amigas, uma diferença mais
visível no grupo.
"Por mais que eu soubesse sobre o assunto, mãe é mãe"
Durante os três anos de medicação, mesmo sabendo
que o protocolo estava sendo cumprido corretamente, Maria sempre se
preocupava: "Durante o tratamento, que consistia em injeções mensais do
hormônio, você se sente mal e se questiona se está fazendo o certo",
relembra.
Angélica sofria com as injeções, o que aumentava a
angústia da mãe, tornando-se o ponto mais crítico do tratamento para as
duas. "Mas, ao final, quando o tratamento termina, você se tranquiliza e
até agradece por ver a criança seguindo a puberdade normal para sua
idade", pondera a mãe.
SAIBA MAIS
Apesar do incômodo, Angélica nunca foi muito
questionadora sobre o tratamento e sua necessidade. "Acho que só
conversamos uma ou duas vezes sobre o tema e depois passou", comenta.
Maria considera que o melhor é abordar o assunto de
forma simples com a criança. "Minha filha era muito nova, então só
expliquei que ela estava crescendo um pouco mais do que as amigas e que
teria que tomar um remédio para conter esse crescimento", explica Maria.
Como Maria é médica, em teoria deveria ser muito
mais fácil lidar com o diagnóstico, justamente por ela entender de forma
mais técnica o que envolve uma puberdade precoce. Entretanto, na
prática, as coisas foram diferentes: "Eu acredito que fui muito
exagerada em minhas preocupações e angústias, com a repercussão
emocional que esse desenvolvimento precoce poderia ter na minha filha".
Hoje, Angélica tem 24 anos e leva uma vida normal.
Como a idade óssea dela era muito avançada (três anos), Maria temeu
bastante que a filha não fosse passar de 1,50 m de altura. "Até a
preparei para que entendesse que não seria a criança mais alta de seu
grupo por muito tempo e tentei não valorizar isso. Mas, no fim, ela
ainda cresceu um pouco mais do que eu esperava e tem uma altura mediana
para uma mulher", conta Maria.
Por tudo isso, é tão importante acompanhar o
desenvolvimento das crianças e procurar um médico caso algum sinal que
caracterize o desenvolvimento puberal apareça antes do tempo esperado. A
puberdade precoce, quando diagnosticada em tempo, pode ser tratada e,
com isso, minimizar o impacto na vida da criança.
"Busque um médico em quem você confie, que defina
corretamente o que vocês estão tratando e o porquê, além de passar a
segurança de que tudo ficará bem", aconselha Maria.
*Os nomes foram trocados a pedido da entrevistada.
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