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terça-feira, 30 de agosto de 2016

FISL 17: o lado ruim da Internet das Coisas e os riscos de objetos smarts


IoT, do inglês, Internet of Things (Internet das Coisas, em português) é o tema da 17ª edição do FISL — o Fórum Internacional Software Livre, evento sobre tecnologia livre que acontece de 13 a 16 de julho em Porto Alegre. Como não poderia deixar de ser, o evento traz tanto vozes críticas quanto elogiosas à tendência tecnológica de dotar objetos comuns (como camas, portas, carros) de capacidade para absorver informações, comunicar-se com a Internet e tomar decisões autônomas. Tudo, é claro, visando o bem-estar do usuário.
Entretanto, é possível que as máquinas possam decidir agir de maneira equivocada. E se, por exemplo, a sua pulseira decidir lhe dar um choque quando você não faz exercícios corretos, ou o banheiro optar por trancar a porta até que você lave as mãos? Esses casos parecem absurdos, mas são reais. As máquinas agora têm poder, e se nós não concordarmos com elas, sofreremos consequências. Seria este o temido lado ruim da Internet das Coisas.
Maiara Ferrari no FISL17 (Foto: Divulgação/Camila Cunha - FISL)Maiara Ferrari no FISL17 (Foto: Divulgação/Camila Cunha - FISL)
Tecnologia tirânica
“Tirania da IoT” é o sugestivo nome da palestra de Maiara Ferrari no FISL. Logo dá pra ver que a designer e especialista em branding é cética com relação à Internet das Coisas. “As empresas não querem desenvolver essas tecnologias para facilitar a nossa vida, mas para gerar lucro. Será que precisamos de alguém [uma máquina] para acender as luzes, para dizer que temos que comprar leite? É só abrir a geladeira!”, questiona.
O lucro, no caso, vem com o aproveitamento dos dados coletados. Uma cama capaz de monitorar as horas de sono, por exemplo, pode enviar a informação não somente para o seu médico, mas também para o seu plano de saúde, que utilizará a informação para cobrar mais se assim desejar.
A estudante de Ciências da Computação Juliana Oliveira, palestrante do FISL, também problematiza. “Será que a gente precisa mesmo dessa comunicação? Acho que tem que ter uma finalidade, não usar simplesmente porque é bom, mas procurar saber o que é feito com esses dados”, argumenta.
Juliana Oliveira na palestra IoT: Things or People? (Foto: Divulgação/Camila Cunha - FISL)Juliana Oliveira na palestra "IoT: Things or People?" (Foto: Divulgação/Camila Cunha - FISL)
Juliana e Maiara alertam que toda essas informações coletadas pelos objetos ficam guardadas em plataformas proprietárias. Ou seja, da empresa fabricante. Logo, essa empresa detêm informações tão íntimas quanto as horas de sono ou o conteúdo da geladeira dos usuários.
“Estamos praticamente pelados na frente das empresas, da nutricionista, do plano de saúde… Eles vão saber de tudo”, alerta Maiara, que vê problemas em todo esse entusiasmo com Internet das Coisas.
Pulseira Pavlov
Talvez você já tenha ouvido falar do experimento de Pavlov, em que um sino é tocado toda vez em que se coloca comida na frente de um cachorro. Com a repetição, o cachorro começa a salivar ao ouvir o som do sino, mesmo que não haja comida nenhuma. O experimento comprova que é possível fazer cães (e humanos também) associarem estímulos a comportamentos. Evitando comportamentos ruins.
A pulseira inteligente Pavlok trabalha com o mesmo princípio: treinar o usuário a reagir por estímulos. No caso, o estímulo é um choque. Você pode programar a pulseira para lhe dar um choque caso não tenha corrido o número necessário de quilômetros num dia, ou caso você comece a roer as unhas. 
Você também pode delegar o choque a amigos, que ficam responsáveis por acionar a descarga elétrica toda vez que você fizer algo “errado” (comer doce, por exemplo). Assim, você associa o hábito à dor.
Ilustração mostra o que acontece a quem tenta burlar o Pavlok (Foto: Divulgação/Pavlok)Ilustração mostra o que acontece a quem tenta burlar o Pavlok (Foto: Divulgação/Pavlok)
“Um garoto que testou o Pavlok diz que o choque dói muito, equivale à picada de uma super abelha”, adverte Maiara. É importante lembrar que a comunidade científica não reconhece mais o tratamento por choques como um tipo válido de tratamento psicológico. Logo, essa não parece uma boa ideia.
Mas, se você achou o Pavlok radical, espere até conhecer o Safeguard Germ. Trata-se de um daqueles esguichos de sabonete líquido usados em banheiros públicos, com a diferença que, se você tenta sair do banheiro sem usá-lo, um alarme é acionado. A porta do banheiro tranca, e você fica preso até lavar as mãos. A tecnologia foi testada em banheiros dos EUA e Tailândia, e levanta questionamentos.
“Será que leva em consideração a cultura, os problemas sociais e comportamentais? O que essa tecnologia faz é jogar os nossos defeitos na nossa cara e cobrar um comportamento”, explica Maiara.
Por uma tecnologia "mais calma"
É possível pensar em saídas para trazer a IoT para o “lado da Luz”. Uma delas é a utilização de código aberto. Por enquanto, os dispositivos de uma empresa só se comunicam com outros dispositivos compatíveis e da mesma empresa. O usuário fica refém de uma só marca. Imagine se a startup responsável pela tranca eletrônica da sua casa desaparece. O que fazer? Isso pode ser solucionado com a adoção de código aberto ou de middlewares (programas que fazem a conexão entre duas linguagens diferentes), que permitam que dispositivos de diferentes fabricantes conversem entre si.
Outra saída é mudar a nossa relação com a tecnologia. Para isso, existem os preceitos da calm technology, movimento que diz que a tecnologia não deve agir “no” humano, mas “ao redor” do humano. Ela deve servir para criar calma e informar somente aquilo que a gente precisa saber na hora certa.
Invenções como a pulseira de choques ou o Safeguard Germ não têm nada de silenciosas e, ao contrário do que diz a calm technology, contribuem para gerar ainda mais ansiedade. O mais preocupante é como esse monte de avisos, alarmes, choques e automações afetam o comportamento humano a médio prazo. Isso nos tornará menos atentos? Mais ansiosos? Teremos comportamentos similares aos cachorros de Pavlov, obedecendo sinos tocados por máquinas?
“Não houve estudo de risco. A gente está sendo jogado nesse mundo sem ninguém saber o que vai acontecer. E as empresas não se importam com isso”, encerra Maiara.

FISL 17: computação cognitiva pode ser o futuro da Internet das Coisas

19/07/2016 17h52 - Atualizado em 19/07/2016 17h52


Guarde bem estes dois termos: “Internet das Coisas” e “Computação Cognitiva”. Nos próximos anos, você vai ouvir falar mais e mais deles. Internet das Coisas, ou IoT, é a tendência tecnológica de mais e mais objetos do nosso dia a dia (carros, geladeira, lâmpadas) terem conexão com a Internet para trocar dados entre si e se moldar ao nosso comportamento. A IoT foi o tema central do Fórum Internacional do Software Livre, evento de tecnologia livre que ocorreu de 13 a 16 de julho em Porto Alegre, e teve diversas palestras e atividades ao seu respeito.
FISL17 (Foto: Divulgação/Camila Domingues-FISL)FISL17 falou também sobre computação cognitiva; entenda (Foto: Divulgação/Camila Domingues-FISL)
“Computação cognitiva”, termo menos conhecido, foi apresentado à audiência na palestra de Antônio Carlos Navarro, gerente de produtos da IBM. Trata-se de uma ideia antiga, mas que só agora se tornou possível: computadores que pensam como humanos e aprendem tambem, como humanos.
Máquinas que aprendem
A computação cognitiva é a habilidade das máquinas aprenderem sozinhas, através de tentativa e erro. Nas gerações anteriores de computadores, as máquinas precisavam ser programadas para entender novas informações, mas uma máquina cognitiva pode fazer isso por conta própria, da mesma maneira que um humano faz. Se um software não-cognitivo se depara com uma gíria nova, ele não saberá o que ela significa; já um computador cognitivo conseguirá compreendê-la ao analisar o conteúdo de textos (como posts em redes sociais) onde ela foi utilizada.
Watson, supercomputador cognitivo criado pela IBM em 2010, consegue analisar bancos de dados gigantescos com linguagem desestruturada (ou seja, linguagem coloquial, que humanos usam) e aprender coisas novas sozinho, sem precisar de programação. Por isso, ele é perfeito para analisar o enorme volume de informação da Internet das Coisas.
 “A IoT extrai um grande volume de dados que mostram o comportamento do usuário e permitem um atendimento personalizado”, diz Navarro. 
“Mas, ter muita informação sem saber como extraí-la não faz sentido”, aponta. Com a computação cognitiva, o computador pode varrer bancos gigantescos de informação desestruturada e sintetizar uma informação coerente.
Navarro dá alguns exemplos: um computador cognitivo pode acessar bancos de dados acadêmicos, aprender tudo sobre os mais modernos tratamentos contra o câncer e receitar tratamento personalizado para um paciente, de acordo com seus sintomas. 
Pessoas têm problemas emocionais, podem ficar nervosas ao tomar uma decisão. A máquina, não 
Antônio Carlos Navarro, IBM
“A decisão de qual tratamento usar ainda é do médico, porém baseada em mais informação do que ele tinha antes”, explica Navarro.
Mesmo assim, terceirizar o diagnóstico para um computador pode ser perigoso, não? Navarro discorda. “As pessoas têm problemas emocionais, podem ficar nervosas ao tomar uma decisão. A máquina, não”, pondera.
Aplicativos já utilizam software cognitivo
Se você acha que esses computadores pensantes vão demorar para invadir o nosso dia-a-dia, pense novamente: diversas empresas já começaram a desenvolver serviços baseados nessa tecnologia. 
O Banco Santander, por exemplo, usa um computador treinado para prestar atendimento ao cliente. É um sistema mais refinado do que as gerações anteriores de chats com respostas automáticas (os famosos bots): o computador cognitivo aprende mais da linguagem natural dos humanos a cada atendimento. O modo de falar, o significado de algumas expressões, gírias – tudo é assimilado com a prática.
No mundo dos apps, existe a Meeka – inteligência artificial que ajuda com preparativos para casamentos. A robô organiza a agenda do casal, gerencia o orçamento do evento e responde a perguntas dos usuários. Além do bate-papo no aplicativo, é possível pedir dicas para a Meeka usando oTelegram.
Meeka (Foto: Divulgação/mecasei.com)Meeka (Foto: Divulgação/mecasei.com)
Outra ferramenta cognitiva é o IBM Chef Watson (IBM.com/cognitivecooking), site que gera sugestões de receitas baseadas na compatibilidade de gosto dos ingredientes. Como a base de pesquisa são estudos sobre a sinergia de alimentos e não necessariamente sites de culinária, isso pode levar até mesmo à criação de receitas inéditas mas que os ingredientes combinam entre si.
IBM Chef Watson (Foto: Reprodução / ibmchefwatson.com)IBM Chef Watson (Foto: Reprodução / ibmchefwatson.com)
Com computadores organizando eventos, atendendo clientes e criando receitas, não é de se espantar se em breve eles possam ser capazes de escrever reportagens ou textos como estes. Quem sabe?