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domingo, 10 de abril de 2011

Por que não vencemos o Aedes aegypti?


foto: José Leomar
Desmobilização da população e falhas nas políticas de saúde contribuíram para a epidemia da doença
FOTO: JOSÉ LEOMAR
Promotora de Justiça solicitou abertura de Inquérito Policial para apurar as 20 mortes por dengue no Estado
O aposentado Paulo Henrique Ferreira ainda se lembra dos tempos de infância, quando tinha a impressão de que para todo mal havia remédio. Depois de contrair dengue na mesma época que seus dois netos, lamenta seu engano. "O mosquito Aedes aegypti está sem controle, mas se fiz minha parte e mesmo assim tive a doença, de quem é a culpa?", questiona o aposentado.

Para infectologistas, a resposta é simples: a falta de políticas públicas adequadas no combate à doença e a desmobilização da população que parece não está nem aí para a enfermidade contribuíram para a nova epidemia que chegou com força total e reforço do tipo 4.

Responsabilidade
Já no entendimento da promotora de Justiça de Defesa da Saúde Pública, Isabel Porto, não só é preciso apontar quais as causas, como também as responsabilidades. Por esta razão, avisa, solicitou abertura de Inquérito Policial para apurar as 20 mortes por dengue no Estado. "Quero saber quais as variáveis que levaram essas pessoas a morrerem, se houve deficiência no atendimento, diagnóstico tardio ou transferência errada".

Na avaliação do médico e especialista em dengue do Hospital São José, Ronald Pedrosa, a situação é gravíssima. "A gente só fecha a porta quando o ladrão entra" ao comentar sobre a correria nos bastidores da rede de saúde pública do Estado a partir da constatação de que o problema é maior do que se pensava.

"Agora já é tarde para colocar o fumacê pelas ruas. Não vai adiantar porque as chuvas levam tudo. A medida é como a maioria tomada pelos gestores da saúde: tarde e sem solução imediata", detona ele.

Para o infectologista, a falta de campanhas frequentes e adequadas para cada período e as ações apenas temporais "para tapar buracos" não resolvem nada, apenas levam a população a descrença e a desinformação. "Eles correm agora e só vão se organizar daqui há três meses, precisando correr contra o tempo, mas só um milagre e mais: não vamos conseguir acabar com os mosquitos. É preciso olhar adiante", afirma.

A sua avaliação é compartilhada com o biólogo João Neto. De acordo com ele, nenhum cientista de bom senso acredita que um dia chegaremos a eliminar em definitivo os mosquitos. O diretor do Hospital São José, Anastácio Queiroz, também pensa assim. Com os corredores lotados de pacientes. Na manhã de ontem, eram 30 espalhados pelos corredores da instituição, Queiroz é comedido na suas afirmações, mas não pode negar a preocupação com o avanço do mosquito Aedes aegypti. "Pode-se vencer a dengue. O mosquito, não. Acabar com o Aedes aegypti é uma missão impossível, somente uma vacina poderia imunizar a população e diminuir tanto dinheiro gasto em prevenção e epidemias".

Uma pessoa, explica, que já tenha entrado em contato com um dos outros três tipos do vírus da dengue e que agora venha a ser infectada pelo DENV-4 se torna dez vezes mais suscetível a desenvolver a dengue hemorrágica. "Nessa que é a forma mais devastadora da doença, os vasos sanguíneos inflamam e, permeáveis além da conta, causam hemorragia". Em 10% dos casos, os pacientes morrem. Já na versão mais branda, informa, a dengue clássica, os sintomas se caracterizam por febre acima de 39 graus, dor de cabeça e na região dos olhos e manchas na pele.

Não importam as diferenças e efeitos, os quatro vírus da dengue enganam com facilidade o sistema imunológico. Isso porque, frisa Queiroz, num organismo que foi contaminado anteriormente, quando a infecção é por outro tipo de vírus, as células de defesa acham que se trata do mesmo micróbio e baixam a guarda. A dengue é nefasta também por causa da incrível capacidade de adaptação de seu vetor, o Aedes aegypti.

Fique por dentro Riscos à saúde
Fêmeas infectadas podem transmitir o vírus para as larvas

1500 ovos são postos pela fêmea durante a vida

15 meses é o período que os ovos suportam em superfície seca, mantendo os embriões vivos

30 minutos é o tempo que os ovos levam para eclodir em contato com a água, liberando as larvas

40% de chance de os embriões herdarem o vírus da fêmea infectada

A fêmea precisa de sangue humano durante a gestação. A cada picada, o mosquito pode contrair o vírus de alguém contaminado

CASOS GRAVESMS havia alertado para situação local
O anúncio do estado epidêmico de dengue do Ceará veio corroborar com o que os hospitais primários, secundários e terciários já constatavam com os seus corredores lotados devido a grande demanda de pacientes infectados ou com suspeita da doença. Além disso, o próprio Ministério da Saúde (MS), em seu último balanço, divulgado em março pelo Diário do Nordeste, apontava o Estado como líder em óbitos do País.

Para se ter uma ideia da situação, os números da época confirmavam 12 mortes pela forma mais grave (hemorrágica e com complicação). Além destas informações, o boletim apontava uma variação de 286% no número de notificações da doença.

O crescimento acima referido, deve-se a comparação feita entre os meses de janeiro e fevereiro deste ano, com igual período de 2010. Para se ter uma ideia, até o dia 26, foram notificados 8.382 casos, já no ano passado, nessa mesma época, esse total foi de 2.171.

Porém, sabe-se hoje que esse quantitativo é bem maior. O dados recentes da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa), divulgados na última sexta-feira, confirmam exatas 20 mortes no Estado do Ceará. Quatro dessas pessoas eram moradoras de Fortaleza, três de Caucaia, duas em Itapipoca e duas em São Gonçalo do Amarante.

As demais pertencem as cidades de Icó, Chorozinho, Ocara, Itaitinga, Acarape, Quixadá, Maracanaú, Granja e Tejuçuoca.

Além disso, o boletim epidemiológico atualiza o número de casos notificados para 18.958. O levantamento mostra também, a real quantidade de pessoas infectadas por dengue 8.308. Desse total, 2.405são de Fortaleza, onde houve uma variação de 43% no número de casos de uma semana para outra, pois até o último dia 25, esse valor correspondia a 1.681 confirmações.

Situação nacional
A região Norte concentra 31,6% do total de casos suspeitos, com 49.101 notificações. Em seguida, estão as regiões Sudeste (27% e 42.092 casos), Nordeste (18,4% e 28.653 notificações), Centro-Oeste (12,3% e 19.066 casos) e Sul (10,7% e 16.701 casos). A maior parte dos casos (53%) foi notificada nos estados do Amazonas, Acre, Paraná, Rio de Janeiro e Minas Gerais

O levantamento da Secretaria de Vigilância em Saúde indica ainda que o sorotipo Denv-1 é o que mais tem infectado os brasileiros. Das 1.856 amostras de sangue de pacientes com sintomas da doença que foram submetidas ao processo de isolamento viral, 335 deram positivo para a dengue e houve a detecção do DENV-1 em 81,8% delas. Ele está em quase todas as unidades da Federação e não circulava no país desde 1980.

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