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sábado, 23 de julho de 2011

Chico Buarque dispara nova leva de canções


Cinco anos e um livro depois do último disco, o cantor e compositor volta à música e lança CD

Rio - Chico Buarque conta que gostava de música americana, ia para um baile de jazz toda semana e queria mesmo era ser baterista. Isso, antes de João Gilberto. Ele resgata a história de sua memória afetiva ao comentar que há inspiração do blues em uma das faixas de seu novo disco, ‘Chico’, que chega às lojas nesta sexta-feira.

Apesar do retorno ao ofício que mais o consagrou artisticamente, após um mergulho na literatura e cinco anos depois de seu último lançamento, ‘Carioca’, ele conta que andava mesmo cansado da música, da exposição e dos shows. “Desta vez, pude trabalhar sem pressão nenhuma, agora que o maestro Luiz Cláudio Ramos tem um estúdio em casa. Não é como quando tem ali um taxímetro rodando em um estúdio de gravação. A cobrança é menor, repetimos quantas vezes foram necessárias”, detalha Chico Buarque, sobre a produção do novo CD.
Foto: Divulgação
No entanto, apesar da satisfação com o resultado (“É o melhor que pude fazer. Não saberia comparar com outros discos meus. Para mim, é o melhor, mas sempre o último é o melhor”, define), parece que ele já vai novamente se afastar da atividade.

“Agora que fechei a tampa do disco, pretendo me desligar de música por um tempinho. Shows, não sei se farei”, descarta. Vai, então, escrever um novo livro? “Também não sei”, desconversa. 

Chico Buarque quer dar um tempo, relaxar. Faz graça ao contar que registrou no álbum seu próprio violão em algumas faixas. Craque das letras, no instrumento, assume, não é exatamente um artilheiro. “Se eu tivesse com as mãos metade da habilidade que tenho com os pés, eu seria um Paco de Lucia”, compara o apaixonado por futebol. “Sou um músico intuitivo. Já a parte literária, eu posso discutir com qualquer um”, gaba-se, cheio de propriedade.

RETRATO DO ARTISTA QUANDO VELHO
“A parceria com João Bosco, na afro ‘Sinhá’, já vale o bom disco”


‘Chico’ é retrato apurado de seu artista quando velho. Aos 67 anos, Chico Buarque reflete sobre a passagem do tempo no pseudoblues ‘Essa Pequena’, em que canta o amor de homem maduro por mulher mais jovem. A maturidade é observada também na sofisticação harmônica que valoriza o repertório do disco feito sob a direção musical do violonista Luiz Claudio Ramos. Não espere encontrar em ‘Chico’ um samba arrasta-povo, como ‘Vai Passar’, ou uma canção arrebatadora como tantas feitas pelo compositor. Se o letrista continua engenhoso, o melodista soa menos inspirado no inevitável confronto da produção atual com seu cancioneiro antigo. 

Ainda assim, há joias no CD. Segunda parceria do compositor com João Bosco, ‘Sinhá’ já vale o disco. É samba de tom afro com letra que reproduz o linguajar do Brasil imperial. É uma lembrança de tempos idos que bem poderia figurar nas memórias imprecisas do narrador do samba ‘Barafunda’. Mas ‘Chico’ é, em essência, um disco de amor, com temas que oscilam entre o sonho, caso da valsa ‘Nina’, e a desilusão, mote da doída ‘Sem Você 2’, inspirada na canção homônima de Tom & Vinicius. Um amor pautado pela maturidade que se reflete neste bom disco que incursiona até pela toada, ‘Querido Diário’, com vozes que remetem às tradições do canto sertanejo.

MAURO FERREIRA 
Crítico de música de O DIA



UM DISCO, NÃO “O” DISCO DO CHICO
“Saudade daquele Chico Buarque sempre surpreendente”


Diante de sua incrível e indispensável contribuição à música, soa como injustiça e até heresia afirmar que, faz tempo, as novas levas de canções de Chico Buarque não são incríveis e indispensáveis como as que o elevaram ao patamar máximo de criatividade e originalidade. Olhando em retrospecto, salvo faixas pinçadas de um ou outro álbum, como ‘O Velho Francisco’, ‘Paratodos’ ou ‘Carioca’, é fato que o cantor e compositor não lança um disco clássico desde ‘Chico Buarque’, aquele de capa vermelha, de 1984, no qual enfileirou uma pérola atrás da outra — ‘Pelas Tabelas’, ‘Brejo da Cruz’, ‘Tantas Palavras’, ‘Samba do Grande Amor’, ‘Mil Perdões’ e ‘Vai Passar’ são todas deste álbum. 

Este novo ‘Chico’ é, sim, repleto de lindos momentos. Se comparado à maioria do que vem sendo despejado no mercado musical de uns tempos para cá, ganha até o status de excelente. Mas, só o tempo dirá, não promete se tornar indispensável. 

Talvez ele nem queira, ou mesmo precise, produzir uma obra da grandeza que atravessa as décadas. Afinal, quem deixou para a eternidade discos como ‘Construção’ (1971), ‘Meus Caros Amigos’ (1976), ‘Vida’ (1980) ou ‘Almanaque’ (1981), não tem que provar mais nada a ninguém. Não se trata aqui de mero papo nostálgico, é que dá uma baita saudade daquele Chico sempre surpreendente.

LEANDRO SOUTO MAIOR
repórter do Caderno D

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